quarta-feira, 28 de abril de 2010

Ela continua

A última notícia que se teve dela, foi que perambulava pelas noites chuvosas. Por ruas distantes de seu bairro habitual, por bairros distantes dos lugares que outrora frequentava. Aqueles que a viram, disseram por aí que estava bem vestida, cabelos desgrenhados por causa da chuva e do vento, mas estava bonita. Dizem também que ela andava sem parar, sem cumprimentar os antigos conhecidos, sem olhar para trás. Quem não a conhecia a julgava como nômade, hippie, louca, suja. Julgavam só. Julgavam. Da família não se sabe, não se viu, pouco se especulou. Só sabemos que ela vaga. Curiosamente mantinha sorriso no rosto e esperança no olhar. Poderia assustar uns e outros talvez, pois na última noite chovia torrencialmente e o frio era cruel. Mas ela sorria. O que ninguém sabia é que um dia o amor a brindou com uma dança e disse: Encontre-me na eternidade. E caminhando, ela foi.

A carta.

 Espero que você não me ache um covarde. Tá, você vai achar, tenho certeza. Eu no seu lugar, acharia o mesmo. É que é difícil demais pra mim, olhar nos seus olhos e dizer tudo isso. Talvez as palavras me faltem, eu gagueje, seria um pouco constrangedor - é mentira, sou um covarde mesmo, eu não queria ver você chorar.
 Não sei bem como começar. Talvez pelo começo, é. O começo... Antes de tudo isso - digo, antes de nós - eu era uma pessoa um pouco solitária e crua afetivamente. Eu nunca soube muito bem como agir, e talvez isso tenha resultado nas minhas experiências catastróficas. Eu te disse, você sabe. Não gosto de dizer o nome dela. Não gosto de lembrar do nome dela. Mas eu lembro. É quase diário. É involuntário. Eu lembro.
Temos que ir pra parte mais difícil. Eu tentei. Tentei fazer dar certo com você, mas as coisas começaram a fugir do meu controle quando eu vi que a sua entrega era total e a minha não. Eu só podia doar metade de mim. Eu só podia doar o que tinha. Eu podia te oferecer muito pouco. E nesses últimos tempos, você me foi a melhor coisa. A descoberta mais bonita que eu já fiz. E eu falo em todos os aspectos. Você é boa demais pra mim. E eu sei que você já ouviu isso, merda, eu sei que isso vai te magoar, mas entenda, eu faço isso por você. Eu não quero que você se entregue mais, pra metade de um alguém, ainda que esse alguém seja eu. Você merece muito mais que isso. Você merece muito mais que eu.
 O tempo que passamos juntos foi tão bonito. Posso dizer que foi mágico. Eu sempre quis ficar assim com alguém. Se lembra quando eu te pedia pra deitar do meu lado naquele sofá velho, você fazia manha, mas ia, sempre ia. Eu podia fechar os olhos e passar toda a eternidade ali. Eu sentia que você era só minha. Mas eu não era, eu não sou. Eu não sou seu, eu não sou meu, eu não sou...
 Me desculpe, eu te peço, me desculpe. Eu sei que provoquei tudo isso e agora parece que estou te abandonando, mas não é isso, entenda, entenda. Não dá pra entender. Eu tenho medo.
 Queria que pudéssemos ser amigos. Sentar, conversar, beber, rir. Você deve estar me odiando. Deve estar pensando que eu sou um escroto. Talvez eu seja. Só por favor me perdoe. Pode rasgar depois de ler.

              Do seu.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Criticamente Pensante

Juro que acho ignorância um enorme desperdício. Somos brindados com uma existência incerta e delimitada por dias, meses, anos. Deve-se considerar que vivemos em uma sociedade capitalista, que prega maçantemente a tradição de trabalhar, dormir, e congelar pensamentos revolucionários. Somos instruídos a ver novela das 9, BBB, ouvir música da melhor qualidade, – música? – passar toda uma pseudo-vida sem desenvolver massa cinzenta – ou pior, não se importar em desenvolvê-la – sendo mecanizado e consumindo sistematicamente. Consciência política, social, ecológica, filosofia, são termos (que para meu medo pessoal) tendem a cair em desuso.

E pra mim, privar-se de pensar, é privar-se de viver, de existir. Já dizia meu grande companheiro Descartes: “Penso, logo existo.”. Mas eu falo de pensar de verdade. Não sei se o problema está em mim, mas chega a ser doloroso, ver que é possível não fazer nenhum tipo de questionamento sobre a vida, sobre a sociedade em que acontece essa vida, sobre tudo. Sobre nada. Sobra Nada. Acho mais interessante uma vida, digamos, sedentária e fértil intelectualmente do que um turbilhão de exercícios externos e um imenso vácuo interior. O problema maior é a indiferença. É querer não saber, é querer ser manipulado, governado, controlado. Os interessados governam, e governam para si. E governam aqueles que não querem governar, não querem pensar, não querem saber. É só o que eu peço por hoje: Pense!